Autor: Leon Cardoso da Silva
(Capítulo de um livro em construção)
É bastante comum confundir-se estes
dois termos. Educação é o ato de educar ou de educar-se, neste caso,
presumindo-se a ideia de que é este um ato em que não se faz obrigatória a
presença de outra pessoa, mesmo que o outro indivíduo possua um conjunto maior
de informações ou conhecimentos. Neste sentido, educação pode ocorrer tanto na
escola, quanto no contexto familiar e individual de cada pessoa. Escolarização
é o processo de aplicação de um currículo cujo objetivo é fazer com que os
estudantes absorvam determinados conteúdos ou “cânones” que por ventura possam
auxiliá-los no processo de auto-afirmação no mundo e reconhecido como membro de
uma comunidade.
A busca pela definição do conceito de educação é
bastante antiga. Ainda nos tempos dos filósofos Sócrates e Platão essa questão foi
tão recorrente que se tornou método até mesmo da filosofia. Isto é, se
analisarmos a conduta de Sócrates, por exemplo, perceberemos que a busca pela
instrução, pelo diálogo e pela construção do conhecimento era o ponto de
partida de sua filosofia - ou de seu método filosófico. Como não havia escolas,
o que se conhecia por educação envolvia uma variedade de conceitos pertencentes
ao cotidiano de praticamente todas as pessoas. Neste sentido, o método
socrático consistia em fazer com que a pessoa refletisse consigo mesma, pois,
nesta perspectiva, o verdadeiro conhecimento vem de dentro para fora, quer
dizer, a própria pessoa pode suprir em si a necessidade de educar-se, sem a
presença do outro.
Isso é bastante simples de ser entendido. Em um
tempo onde não existiam escolas, como conhecemos, as pessoas eram responsáveis
tanto pelas suas próprias instruções, quanto pelas instruções de seus
dependentes. Assim, surgiram os “preceptores”: pessoas (ou professores) cujo
objetivo era instruir outras pessoas, geralmente os filhos dos mais ricos, pois
podiam pagar pelos serviços do preceptor.
Podemos dizer que a primeira escola surgiu quando
Platão, por volta de 378 a. C., fundou um grupo de estudos[1],
principalmente, sobre filosofia e matemática. Os encontros ocorriam num jardim
chamado Academo, na cidade grega de Atenas - por isso o nome “academia”. Se
hoje fossemos classificar um destes encontros de Platão, classificaríamos tão
simplesmente como algo análogo a uma “aula de campo”.
Isso tudo fica ainda mais claro quando lembramo-nos
do fato de que Platão foi um dos discípulos de Sócrates. Quer dizer que a
estrutura de sua academia tinha uma base centrada na reflexão e no diálogo, tão
elucidados por seu mestre. Portanto, os encontros da academia baseavam-se em
debates, questionamentos e discursos.
A partir desta observação, podemos entender que a
ideia de educação parecia ser, para Sócrates e Platão, não uma imposição
exterior, isto é, externa e independente do ser, mas uma condução para esse esclarecimento
na exata medida em que educar não consiste em imprimir ideias externas na mente
do outro. A verdadeira educação, pois, nada mais é que dar meios ao outro para
que este, numa perspectiva real, chegue, por fim, a verdadeira ideia desse
real. Nesse sentido, podemos dizer que educar não é o que vulgarmente se pensa,
como diria Platão. Para ele não é “introduzir ciência numa alma” como “se
introduzisse a vista em olhos cegos”.
Com o passar do tempo, surgiram escolas como
conhecemos atualmente, com currículos, estudantes e professores em sala de
aula. Isso ocorreu a partir do século XII na Europa. Antes disso, encontros que
ocorriam, com estes objetivos, eram realizados em locais abertos.
Com o surgimento de “escolas”, surge,
também, o conceito de “escolarização”. Haveria, portanto, uma delimitação entre
estes termos que, visto em conjunto, parece unificar suas singularidades e
aproximações. Acontece que por escolarização entendemos ser o conjunto de
estratégias e conteúdos bastante diversificados utilizados pelas escolas com o
objetivo de formar o indivíduo para o convivo social ou em grupo. No processo
de escolarização as pessoas podem adquirir conhecimentos, conhecimentos estes
que em conjunto podem auxiliá-las na vida prática e social.
A exemplo disso, podemos observar
que no processo escolar – portanto, no processo
de escolarização – conteúdos intelectuais e habilidades são passadas para as
crianças, jovens e adultos sempre com o objetivo desenvolver o raciocínio, além
de provocar a reflexão sobre diferentes problemas, auxiliar no desenvolvimento
intelectual e contribuir decisivamente para a formação de pessoas conscientes
de seu papel social com capacidades de gerar transformações positivas na
sociedade.
Em nossa contemporaneidade, parece
haver uma ressignificação do que se entendia por “educação”. Entretanto, esta
ressignificação não rompe com o conceito comum ao afirmar que a educação não é
simplesmente o conjunto de saberes, mas de saberes para a vida moral e íntima,
não somente para a vida coletiva e externa. De um lado, a educação visa inserir
o homem na sociedade marcada pela necessidade de valores significativos. Por
outro lado, a escolarização o qualifica, na medida em que o ensina a dominar
certos conteúdos intelectuais para viver e interferir na sociedade.
O que dizer, por exemplo, de uma
pessoa que nunca frequentou escola? Diríamos se tratar de uma pessoa sem
educação, sem instrução, sem as duas coisas ou com as duas coisas?
Na verdade, educação independe de um ambiente
escolar. Assim, a pessoa pode ser muito educada sem ter frequentado escola.
Tem-se um ambiente educacional, por exemplo, em grupos de convivência
promovidos por ONGs ou programas sócio-assistenciais, em escolinhas de esportes
como futebol, natação e outros. Mas, é no seio familiar que esta educação tem
sua principal razão de ser[2].
Parece correto, portanto, afirmarmos
que a educação precede a escolarização e esta última é uma complementação, mas
não uma substituição da primeira. Entretanto, para que haja uma boa
escolarização é necessário ter havido antes uma boa educação. Se analisarmos a
sociedade atual, não será difícil percebermos que diversas são as pessoas
colocadas à margem da sociedade. São resultados de um processo histórico
marcado[3]
pelo fracasso tanto no processo de educação, quanto no de escolarização.
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